domingo, 6 de outubro de 2013

Fazer o que a gente ama nem sempre é fácil

Fazer o que se ama nem sempre é fácil. Amar o que se tem, idem. Tudo converge para que boa parte do tempo a vida siga mais ou menos. Mais ou menos bem, mais ou menos interessante, mais ou menos instigante. Difícil é tomar as rédeas de quem somos, do que fazemos, colocar a cara dura na janela, e (se) arriscar. Para fazermos o que amamos, muitas vezes, é necessário ir de encontro a algumas antigas convicções. Discordar de parentes, amigos, comprar briga com o chefe ou mesmo pedir demissão do emprego. Não é feliz quem não arrisca. Quem não ousa assumir estar perdido, e começar a buscar um caminho. A vida é feita de pequenos e intensos momentos de encontros, acompanhados de muitos desencontros. A gente cresce ouvindo histórias de príncipes e princesas, meninas se divertem com barbies e, quando mais velhas, assistem a novelas. As músicas nos bombardeiam com um ideal de vida e de amor romântico. Mas nem sempre é assim. Acontece de o príncipe virar sapo. De seus sonhos custarem a se realizar. O fator tempo, e a sorte, entram em cena para tornar este jogo (a existência) ainda mais imprevisível. Mais fácil viver medianamente, já que andamos sempre com pressa. Na pressa, não há tranquilidade para tocarmos e encararmos o que realmente interessa. A vida corre. Cada vez mais. Mal temos tempo de nos olhar no espelho, ou através da janela. Mal cultivamos tempo para cuidar de quem amamos - ou do que amamos. Mas se desejamos ser autênticos, e colocar em ação todo o potencial que carregamos desde o nosso nascimento... (sim, acredito que todos tenham talentos a serem desenvolvidos).. precisamos romper com o já estabelecido. Precisamos sair do conforto, ter disciplina, criatividade, e muita ousadia. A vida planifica, muitas vezes apequena... Mas cabe a gente romper com este manto de normalidade e perguntar - estamos realmente felizes? Eu acredito no que faço no meu trabalho? No que falo dentro de casa? Nosso planeta atravessa um momento de muitas guerras, discórdias e - felizmente - manifestações. Inquietações, interrogações. Que tal olharmos para dentro da nossa casa - nossos pensamentos, nossos corações, e fazermos da vida algo mais ... vivo?

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Futebol, política e religião: é hora de debater – não discutir!



Atualmente atravessamos em nosso país um momento de muita efervescência. Jogos preparatórios para a Copa do Mundo; manifestações por melhorias na política, na economia, saúde e educação; visita do expoente máximo da Igreja Católica, o papa Francisco.

Andando pelas ruas, nestes tempos de guerra e paz no Rio de Janeiro, que confusão: não se sabe quem é manifestante patriota; peregrino; manifestante vândalo infiltrado; peregrino infiltrado; amante de micareta; careta; policial infiltrado; bandido infiltrado; bandido; joelho infiltrado; policial; Mulheres de chico; Francisco... Nossa cidade e nosso país ganharam um ar – ainda que por enquanto apenas nas ruas - verdadeiramente democrático.

Mostramos ao mundo que não somos tão somente o Brasil do futebol e do carnaval. Mais do que nunca, cremos que Deus é Brasileiro e pode fazer milagres. Como levar uma multidão para protestar, colocar os desejos para fora, dizer a que viemos e o que buscamos. Numa nação que parecia dormir em berço esplêndido, isso é muito. É quase um sonho. Ou melhor: um sonho acordado. Sobre o que virá por aí, pouco sabemos. Já protestamos ao lado de estádios de futebol, para chamar a atenção de quem está de olho na Copa. Já fomos ao Congresso, bater panela na porta da casa de políticos, lançamos pedras e sonhos em frente a prefeituras. E agora, vivemos um momento transcendente. A visita de um Papa, que nos lembra do lado de cá e do lado de lá da vida. Um Papa chamado Francisco, que ao menos no nome nos lembra de valores ligados à simplicidade, humildade, generosidade. Embora esses eventos tenham naturezas bastante diferentes - futebol, política e religião – parecem ter sido orquestrados (quem sabe?) por forças astrais que nos fazem sair da rotina. Colocar as bandeiras para fora da janela, refletir sobre o uso que fazemos delas... Olhar para dentro do nosso coração. Exigir mudanças que não podem esperar. Pois nosso corpo é feito de sangue. Nossas veias pulsam, a vida é aqui e agora. O que estamos fazendo da gente? Todas essas reflexões, suscitadas pela inquietação do mundo que nos cerca, não são em vão. Assim esperamos. É hora, sim, de debater futebol, política e religião. Ao contrário do que nos ensinaram desde que viemos ao mundo – "sobre estes temas, não se discute”. Essas três áreas estão envoltas por um componente passional - onde mora o "perigo". Mas a diferença entre futebol e política e futebol e religião... é que o primeiro (futebol) não altera substancialmente a vida de ninguém. Já nos outros dois campos... não circulam bolas e jogadores... mas entram em cena valores e decisões que alteram a vida de muita gente. De forma imperiosa e impiedosa. Mais do que nunca, é hora de refletir, trocar ideias, pensar nossa política, nossa religião, nossas crenças e formas de inserção neste universo. Debate é sempre sadio – a não ser quando uma torcida parte para agredir a outra, apenas porque não compactua com a mesma bandeira. Isso, sim, é vandalismo. O resto é necessidade – urgente – de evolução.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Da vontade de ser mãe


Desde que o Bruno se foi, sem dizer nada, bem no alto da madrugada, andei muda. As palavras pareciam pequenas, sem o superlativo (do) amigo. Ainda converso com ele, todos os dias, talvez mais que antes. E agora, acordando deste grande inverno dos sentidos, percebo que ficar distante do Balaio, igualmente, não me fará bem.

Com a partida do Bruno, também eu me senti menos viva. Por este motivo, volto a falar. Falar da vontade de criar, multiplicar, construir, produzir... que reside no ímpeto da escrita e na vontade de ser mãe.

Coisa estranha, essa, que guardamos no ventre desde que somos pequenininhas e que parece florescer com força total lá pela casa dos 30/35 anos. Algumas mulheres fazem deste desejo o combustível para ir além no trabalho, acolher parentes e amigos debaixo dos braços, construir uma bela casa, edificar um casamento, enveredar por terras distantes e viagens maravilhosas.

Mas, para algumas de nós, a capacidade de gerar outra vida se parece tão mágica que abdicar da empreitada seria como viajar ao Egito sem conhecer as pirâmides.

Estranha a sensação de sermos meio gente, meio animalzinho. Temos um ciclo de vida reprodutiva por meio do qual nos ligamos à Terra e, nesta nossa particularidade humana, sentimos vontade de nos unir amorosamente àquele que escolhemos para andar por aí, vida afora, criando novas vidas.

Vontade de ser mãe é como a vontade de dar o primeiro beijo, experimentar a primeira transa, ou ter o primeiro namorado. É como a vontade de dirigir, de viajar sozinha, ou conhecer novas pessoas. Acontece. Dá o “clique” e, depois que bate, não tem mais volta.

Pois fui “fisgada” por este desejo. Algumas mulheres despertam para esta vontade ainda bem jovens. Outras, não despertam: são despertadas pela criatura já plantada em seu próprio ventre. E “acordam” para a maternidade na marra. Fui acordada por duas meninas, filhas daquele a quem tenho escolhido. Estas doces criaturinhas despertaram a mãe que eu guardava em meu ser, adormecida.

Ser mãe – o que representa isso para tantas e tantas mulheres? No meu (e em tantos outros) caso(s), o desejo está intimamente ligado à feminilidade, ao erotismo. À vontade de se fundir ao ser amado e produzir, com ele, algo que dure “para sempre”, sobrevivendo à nossa própria existência e criando, neste mundo, novos pensamentos, sentidos, alegrias.

Poderia dizer que o desejo de ser mãe é também o de gerar, com o cara com quem desejamos andar por aí, vida afora, nossa maior “obra de arte”. Não há nada mais grandioso, belo e perfeito do que criar, de um amor, um(a) filho(a).

Ser mãe é ter seu corpo modificado por alguns meses, e abrigar nele um ser que te acompanhará por toda a vida. No caso materno, baixa sobre nossa alma e nosso corpo físico uma sensação devastadora de acolhimento e plenitude. A idade parece acentuar o desejo, que trazemos desde que começamos a almejar, para nosso próprio ser, uma família.

Algumas de nós entram em pane, dão curto circuito, ao perceber que a idade passa e a maternidade não vem. Mudam os planos, redirecionam energias, tentam administrar a tristeza pelo desejo (talvez) não realizado.

Claro que, hoje em dia (felizmente) não acreditamos ter nascido somente para dar à luz a uma criatura que precise inicialmente de fraldas, leite e colo. Mas, ainda assim, o desejo de ser mãe é tão antigo e patente quanto a presença dos dinossauros na Terra.

Quando pequenas, nos admirávamos ao observar, na escola, aquele singelo pé de feijão, brotando de um algodão, a cada dia mais forte. Agora, mais velha, sonho com o dia em que terei força e condições de plantar com amor os novos pezinhos a serem fincados neste mundo.

Espero, com calma, sabendo que este dia será fruto da construção de uma história, que deve vir antes de qualquer filho. Uma história de companheirismo e, antes de qualquer outra coisa, amizade. Amizade profunda, encantada e sedutora, a qual chamamos de amor.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Novelas, o bem e o mal na tevê

Não sou uma fã calorosa de novelas. A novelinha da vida real me intriga muito mais. Acompanho de perto o drama de minhas amigas, parentes, colegas de trabalho. Às vezes histórias nem tão emocionantes, cheias de suspense, dor e alegria, mas histórias de vida, que me interessam, emocionam, alegram e fazem sofrer. As pequenas alegrias, conquistas e decepções dos seres humanos são, aos meus olhos, material riquíssimo. E quando eu sou de algum modo envolvida com os personagens destas “tramas”, ou mesmo protagonizo algumas delas, acompanhar as novelas se torna inevitável – as novelinhas da vida real.

A respeito das novelas da tevê, gosto quando se parecem com as tramas da vida real. Nunca gostei de novelas altamente cheias de suspense, intrigas ou luta pelo poder. Porque a vida me parece muito mais que isso. Por este motivo, sempre fui fã daquelas que narram histórias do cotidiano, da vida de pessoas comuns.

Lembro que na infância adorava Top Model, A Gata Comeu. Via no Nuno Leal Maia de Top Model, com aqueles filhos todos, algo do meu próprio pai e irmãos. Lembro até hoje de uma cena em que a Jô, personagem da Christiane Torloni em A Gata Comeu, beijava, um a um, os porta-retratos de seus ex namorados. Um apego ao passado com o qual eu já me identifiquei diversas vezes. Eram novelas despretensiosas, até ingênuas, que me encantavam.

Hoje me vejo capturada pela trama de Avenida Brasil. Praticamente todos os atores desta novela me parecem perfeitos em seus papéis. Adoro ver o núcleo do subúrbio, seu Leleco com síndrome de corno, a excelente periguete e seu namorado gay, a empregada que faz de tudo para criar bem seu filho, e se vê surpreendida pelo rebento marginal. Sem contar com a vilã maior da novela, interpretada pela Adriana Esteves.

Encaro as novelas como fenômeno de massas. Algumas capturam a gente como final de Copa do Mundo. E, se capturam tanta gente assim, algo de interessante ou válido (ainda que um punhado de fortes emoções) elas têm para nos transmitir. No entanto, assisto algumas novelas e me deixo levar por elas com olhar extremanente crítico. Me incomoda ver que a tônica de Cheias de Charme, a novelinha das sete, é o consumismo desenfreado. Ao contrário do que se possa pensar, a novela não é uma “ode” às empregadas, às suas vidas muitas vezes ásperas e cheias de desafios. Tampouco é sobre o poder dos sonhos na vida de um ser humano – o que, por si só, seria ponto para o “bom e belo” na tevê. Nesta trama, tudo o que as “curicas” querem, no fundo, é ser como as “patroetes”. Ter o que elas têm, poder comprar e usufruir do que elas usufruem.

Mesmo reconhecendo estes valores – que de modo algum são os meus – nestas tramas, gosto de apreciar a interpretação de uma excelente atriz, como a Cláudia Abreu. E as músicas grudam que nem chiclete, nos falando de um universo da fama e de um brega chique que a cada dia nos é mais familiar…”Hoje em dia o dinheiro está na mão das modelos, dos jogadores de futebol e das empreguetes”, disse certa vez um dos personagens da novela das sete. Assistir novela não deixa de ser um exercício filosófico e de reflexão antropológica.

Os últimos capítulos têm me incomodado pois as moças passam de shopping em shopping, de cobertura em cobertura, radiantes com a fama que conquistaram graças aos seus hits chicletes. Os autores poderiam evocar neste momento outros valores, outros aspectos da fama.. Mas, ao contrário, parecem buscar alimentar no público o fascínio pela fama, pelo dinheiro, pouco acrescentando de novo a eventuais filosofias e antropologias que poderiam repousar sob a trama – e enriquecer nossa vida.

Também Avenida Brasil.. tem apelado muito – e sido perdoada, por mim, em nome das excelentes atuações. A novela fala da obsessão, da sede de vingança. Mas, muitas vezes, me passa uma péssima sensação, como se na vida não houvesse, de novo, nada além da busca pelo poder, pela revanche, a vingança e – sempre – o dinheiro. Não há sequer um personagem que realmente questione a felicidade que vem com o dinheiro, que realmente faça o público pensar, se alegrar com o “belo e o bom”. Exemplo de dignidade, também a senhora do lixão esconde um passado sombrio e ainda desconhecido do público.

A protagonista da novela sacrifica o amor de toda vida em prol desta sede de vingança. E assim vamos, sendo envolvidas numa sequência de emoções fortes, cenas de suspense quase constante. Nada contra as novelas da tevê. Como disse, vejo, acompanho algumas, me envolvo. Mas, rogo aos autores, que a diversidade e riqueza da vida não seja reduzida ao poder do consumo, do dinheiro e às tramas que só falam às emoções mais fáceis de se alcançar.

O cinema americano está cheio de exemplos de histórias bem contadas e cheias de emoções violentas. Vez em quando, aparece algum revoltado louco no cinema...

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Continuação da carta: passeios com Bruno


Bruno deixou por aqui tantas coisas... Expressões superlativas “Noooossa!” “Interessantíííssimo!” “Julíssima!”. Uma gargalhada sonora e gostosa.

Deixou no meu ombro uma marca, do dia em que andávamos de bicicleta pela ciclovia de Ipanema e acabei caindo feio no chão. Foi embora a ferida, mas ficou na pele a lembrança, devidamente suturada pelos raios de sol. Difícil acompanhá-lo, pedalava tão rápido, sempre à frente de tudo e de todos. Corpo e mente em intenso movimento.

Uma vez, quase caí de cara no chão dos nossos 15, 16 anos... Tentava acompanhá-lo de patins, descendo uma rampa no Aterro do Flamengo. O resultado foi fratura num osso que nem sabia existir (descobri que se chamava “escafóide”).

Bruno me fazia perceber a existência de coisas que escapavam ao meu conhecimento. Era desses que ativam nossa intuição. Com ele o tempo era hoje e o momento, agora.

Certa vez acordei em Friburgo com o amigo quicando frenéticamente uma bola de basquete. Intensidade em pessoa querendo viver às 8h da manhã. Em pleno frio serrano.

Tão bom lembrar da volta desta viagem. Estacionados na porta de casa, ele me olha esperto e diz: Vamos agora à Praia da Joatinga? Guardamos as malas e partimos, na hora, para o céu azul e o solzão que expandia aquele nosso encontro.

Em janeiro deste ano, saudosa, reencaminhei para ele uma mensagem antiga. Imediatamente, vinha a resposta:

"eeeeeeeeeeeeee!!!!! que bonito! que surpresa! e que dia bonito hj, tb! quando celebramos o sol, a praia e o mar, novamente? (podemos celebrar a lua tb num banho de mar no posto 6 ou Arpoador...)"

E lá íamos nós, andando e tomando água da coco. Sempre tão pouco o tempo para tanto papo e afeto. É assim que Bruno vive em mim: andando a pé pela cidade, me levando sempre adiante. E eu querendo ficar, apenas mais um pouco, do seu lado.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Carta a um Amigo


Perdi um amigo que para mim era a liberdade. Ele todo era livre, tão livre, que carregava asas. Um dia tentou voar, muito mais alto do que jamais havia sonhado. Saltou amplo no espaço e nunca mais acordou.

Esse amigo para mim é hoje um perfume. O cheiro do incenso que havia em seu quarto. Brisa doce. Barulho de chuva batendo no vidro de casa.

Quando sinto meu peito se abrindo e a respiração pedindo mais vento... é o Bruno quem eu vejo. Nestes dias em que estamos fartos de tudo e temos tanta vontade de uma vida mais bela... Eu tento olhar através da janela: e lá encontro o amigo. Chamando meu nome. Sempre disposto a desbravar um pouco mais do espaço. A explorar ainda um pouco mais a vida.

Bruno não pôde ficar. Não sabemos – nunca talvez saberemos - qual foi o motivo. O que sei, apenas, é que tentou voar. E voou.

Ele, que sempre gostou das alturas. Do alto dos montes, dos morros, das serras. Ele, que sempre soube apreciar a cidade vista de cima, por cima dos prédios, de todos os prédios de cinza e de pedra.

Para mim, Bruno é uma cor, um cheiro tão próprio e muita alegria.

O seu olhar era um jardim florido, como o lá de Friburgo, em dia de sol. Quando ele falava, eu toda acordava, para prestar atenção. Viagens e mais viagens. Muitas vezes, interplanetárias. Ele trazia de seu pensamento muitas pedras preciosas, conchinhas, ouro e estrela do mar.

O Bruno, quando falava, me fazia rir por dentro. Ele era um artista. Maior que Michael Jackson, Madonna ou Charles Chaplin. Muito maior: porque ele era meu amigo. Um grande amigo. O primeiro amor.

Com ele, pela primeira vez, percebi que um homem pode também ser uma pessoa muito sensível. Um homem pode ter ombros largos, bons de abraçar e serem abraçados. A um só tempo, acolher e pedir colo.

Era um homem que percebia a natureza tão própria de cada criatura, com sensibilidade, perspicácia e muita doçura.

Dividia com a gente as adivinhações que fazia, sempre de forma espirituosa e espontânea. Do lado dele, a partir de um certo momento da vida, eu queria apenas me sentar e ouvir. Talvez aplaudir.

Eu pedia conselhos, queria sempre saber um pouco mais de suas impressões. Sobre as pessoas, as coisas, a existência.

Uma vez, triste com o fim de um namoro, fui almoçar com ele em um restaurante japonês, lá no alto de um shopping. No meio da nossa conversa, descobri que eu não estava mais triste. Não tinha um namorado, mas tinha um amigo. O que mais eu podia querer? Prometi ali, para mim mesma, que nunca mais sofreria tanto no mundo, porque, quando me sentisse só, bastava que me lembrasse dele.

Tem coisas que a gente pensa, e se esquece. E a vida passa, e passa a cada dia mais. Voando.

O Bruno dormiu e não mais acordou. Foi embora sonhando, para um mundo onde sonho já não é mais fantasia.

Com este amigo, eu tinha um tipo de relação que temos com plantas e bichos. Não precisamos nem falar. O silêncio era cúmplice. As palavras apenas cobriam com fina camada um horizonte verde, profundo, e farto. Horizonte plantado, regado e cultivado por eras a fio.

Amigo de infância. Amigo de histórias. Irmão em criatividade, em mundo da lua, em vida do avesso.

Juntos, tiramos um dia uma foto, que bem simboliza a nossa amizade: mãos dadas, frente a frente, e nossas bocas abertas em um enorme grito. Olhos bem acordados, gritávamos para o mundo da nossa adolescência. Inquietação, vontade de viver e aprender um pouco mais. Este era o meu amigo.

Este é, para sempre, o meu amigo Bruno.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Luisa está no Brasil


Minha irmã, Luisa, não está no Canadá. Está no Brasil. Com os dois pés bem fincados no chão, anda revoltada com a situação dos desalojados de Pinheirinho, localidade em São José dos Campos que pertence à massa falida da empresa de um investidor de nome árabe.

À serviço da especulação, do lucro desgovernado, o terreno está sendo desapropriado pela polícia paulista.

O destino dos moradores, na área desde 2004, é incerto.

Seis mil pessoas sendo tratadas pela mídia como "vândalos" e "baderneiros". Uns marginais.

O terreno, finalmente, está sendo desocupado. Deu na tevê. É a Justiça.

Felizmente, Luisa, que está no Brasil, não aprovou.

Luisa se chateia, se irrita, chora. (Lá em casa, dizem que ela chorou).

Por que se importar com os moradores de Pinheirinho, se esta noite haverá transmissão do BBB e do fantástico reality show "Mulheres Ricas"?

Luisa é boba... menina ainda.. !

Não sabe de nada...

Não quer vender imóveis nem ver sua imagem estampada em algum outdoor.

Não quer ser modelo, nem posar nua. Tampouco aparecer em propaganda de grandes empreendimentos.

A moça quer, apenas, um pouco de justiça social.

No terreno de Pinheirinho, havia sido construída uma biblioteca comunitária. Totalmente incendiada.

Mas pra que ler, se o que vende é a fama?

Luisa está no Brasil, escolhe este país e quer ser professora.

A moça anda triste. (Lá em casa, dizem que ela chorou).

Existe a possibilidade de, quem sabe, embarcar para bem longe.

Mas prefere os nossos ares daqui.

Luisa não quer saber de pós-graduação em inglês, francês.

Quer mesmo é dar aula em escola pública.

A moça acredita em política.

Felizmente (sim, é verdade!) ainda existem Luisas.

Luisas, e muitas outras, e tantas delas, neste país.

Que saem às ruas, choram, brigam, protestam.

Isso, ninguém me contou. Eu vi.

E não foi na tevê, twitter ou facebook.

Luisa existe: está lá em casa.

No CEP 22061040.

Em Copacabana, no Rio de Janeiro.

Luisa está no Brasil.